quinta-feira, 3 de maio de 2012

BRANQUINHO DA FONSECA: O BARÃO


O pretexto é simples: entrando na Biblioteca de São Domingos de Rana, deparo com os cartazes que anunciam uma exposição sobre o escritor Branquinho da Fonseca.

Branquinho da Fonseca escreveu um romance, ou uma novela, se levarmos em conta a extensão (a qual não é a de um conto nem, propriamente ainda, a de um romance), que me pertubou o sono. Não tendo voltado a lê-la desde há mais de vinte anos, recordo-a, todavia, com uma estranha precisão, o que não é dizer pouco.

A escrita é contida, quer dizer, evita uma espécie de vertigem poética; contudo, não evita a beleza nem a originalidade. O que é curioso, porque mostra o meio-termo interessante, entre os autores que se embrenham no saborear da linguagem, esquecidos quase de que havia qualquer coisa a narrar, ou seja, uma história [ocorre-me o exemplo de José Luís Peixoto, embora eu goste de JLP], e aqueles que fazem da secura um modo de escrita, como se a história dispensasse qualquer retórica [e ocorre-me, entre os de hoje, um outro exemplo, que também não desprezo: João Tordo]: e esse meio-termo está em Branquinho da Fonseca, como em Cardoso Pires ou em algum Carlos de Oliveira; o da beleza que reside num acto de contenção mas não de despojamento, numa busca da "palavra certa" que seria, na sua exactidão, a mais bonita e, de algum modo e paradoxalmente, também a mais inesperada.

O Barão é uma novela que me apetece denominar neo-gótica, pela criação de um ambiente sinistro, todo envolto em enigmáticas sombras, e onde, ao invés de Drácula, somos postos em face do proprietário fascinante e misterioso de um título, terras, um castelo. É a reconstituição do tema do hóspede, que, sendo recebido por quem lhe dá conforto, calor, que comer e beber, e que dormir, o trava na antecâmara de alguma história antiga, um mistério adivinhado, um fascínio terrífico, e sublime, e pavoroso.

Branquinho da Fonseca anda arredado - mas José Cardoso Pires e Carlos de Oliveira também, e são certamente do melhor em que a literatura portuguesa contemporânea se realizou.

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