segunda-feira, 23 de maio de 2011

PHILIP ROTH: O COMPLEXO DE PORTNOY


Uma primeira ideia tem de se reconhecer, a propósito deste livro; não é com certeza uma ideia politicamente correcta, mas parece-me evidente: não se pode ridicularizar um judeu, a menos que seja um judeu a fazê-lo. [Relendo, descubro que o que torna esta afirmação «politicamente incorrecta» é uma ironia que, no entanto, não sei se é aqui evidente...]. Se o autor não fosse Philip Roth, tornava-se obrigatório acusá-lo de anti-semitismo. Mas alguém como Roth pode desenvolver o seu espírito crítico e o seu olhar demolidor em relação a uma cultura carregada de mitos e de preconceitos: como todas as culturas, de resto, com a diferença óbvia de que as outras não foram tão metodicamente perseguidas, descriminadas, atacadas.

Não gosto de todo o Philip Roth. Mas considero O Complexo de Pornoy e A Pastoral Americana dois livros maiores, absolutamente inesquecíveis.

Sobre O Complexo de Portnoy, aliás, há um outro pormenor, ainda, capaz de gerar uma certa propensão para que o amem mal. É um romance que toma por protagonista um jovem que encarna o lado menos amável - se não o mais odioso - da adolescência masculina: a curiosidade sexual vivida como algo de corrupto e sórdido, numa perpétua tensão entre a regra e a porcaria.

Aliás, se principiei por falar acerca da dimensão judaica presente no romance, e acerca da sua dimensão libidinal, é porque tudo nesta história se move sob o peso asfixiante da norma (ética, religiosa, familiar: é de judaísmo que se trata) que culpabiliza a consciência desse jovem, incapaz de controlar o seu impulso sexual. O «complexo» em causa é precisamente esse: o de se crescer na descoberta e na atracção, perante a culpa terrível de uma mãe castradora, personificação da estrita exigência de um Deus implacável.

Há, em Roth, um humor maldoso, uma ironia que se auto-destrói, a provocação de um riso interdito, em torno das referências típicas de um judaísmo contemporâneo, que tem como pólos a América do Norte e Israel, o psicanalista e o rabi, o sexo e a mãe, as amantes sucessivas ou a masturbação desde sempre versus os mandamentos de Deus. E nesta incapacidade de gestão se escreve um romance maldito, deliciosamente corrosivo e literariamente superior.

1 comentário:

Beatrix Kiddo disse...

esse senhor esta em todas as frentes e nunca li nada dele