Acabei, ontem à noite, de ler Catedral, de Carver.
E se já me tinha referido, aqui mesmo, ao agradável espanto que foi a descoberta - já tardia - dos contos deste autor; se escrevi um post sobre as suas personagens e situações, e (como diz o próprio) sobre a sua arte de trabalhar eficazmente os «lugares comuns», não pensei que, chegando ao último conto, precisamente «Catedral», presenciasse tamanha superação das histórias que ficavam para trás. [Que no entanto, repito para que não subsistam quaisquer dúvidas, já me tinham impressionado muito].
«Catedral» é soberbo. É verdadeiramente fantástico! Socorro-me de adjectivos, que, em geral, prefiro evitar. É um conto perfeito: no sentido de humor politicamente incorrecto, quase cruel, mas que, no fundo, não exprime senão o misto de ciúme, curiosidade e ignorância com que o narrador nos conta como hospedou, em sua casa, um homem cego, amigo antigo de sua mulher; na fronteira, pouco nítida, entre, uma vez mais o «lugar comum», e uma sensaçõe de estranheza que ronda, vai penetrando, penetrando, e corroendo os alicerces da normalidade; e pela ideia, propriamente dita, em volta da qual o conto se fabrica. A ideia que, na sua imprevisível simplicidade, representa, ao mesmo tempo, um tratado acerca da visão e a invisão; (um ensaio sobre a cegueira?); e acerca dessa espécie de mundo que se abre, ensinando e tranformando, secretamente, aqueles que procuram ensinar e transformar alguém; e acerca de como, no terreno do desconhecido e do incompreensível, nos aguardam as portas de novas compreensões - porventura inexplicáveis, elas próprias...
Saio hoje do trabalho, desço a uma livraria. «Qua mais tem de Carver?», pergunto. De momento, nada. Só encomendando. «E que posso encomendar dele?», insisto.
Falam-me de um título que não me é estranho: De que Falamos Quando Falamos de Amor.
Espero, pois, por Carver.
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