quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

EVELYN WAUGH: REVIVER O PASSADO EM BRIDESHEAD


Meu primo veio passar o Natal. Almoçámos um par de vezes, ouvimos fado, reunimo-nos na noite de Natal, conversámos. E, neste pouco tempo, teve tempo para semear uma curiosidade literária.

Inaugurado um novo ano sob o signo da crise e da austeridade, decidi que vou ser parco numa coisa que me é prioritária, mas cara. Os livros. Não significa, naturalmente, que economize na leitura - significa que terei de pedir emprestado e frequentar bibliotecas. E, contudo, o interesse que o meu primo semeou andou a martirizar-me, a roer, a bater contra as paredes. Fiz o pior que um viciado em luta contra o vício poderia ter feito: entrei no local do tráfico: uma livraria. Queria ver o livro em causa, tomar-lhe o peso, abri-lo; queria cheirá-lo, ler umas frases. Acreditei, no fundo, realmente, que teria força para resistir? Ou, secretamente, já sabia que não tinha a menor hipótese?

Comprei Reviver o Passado em Brideshead. Sei que houve uma série na televisão, talvez um filme. Não os vi. Tinha dito ao meu primo: «Sei que houve uma série na televisão e acho que houve um filme, mas nunca os vi». E meu primo respondeu-me: «Então, olha, não vejas, não antes de ler o livro. Depois, farás o que quiseres, mas primeiro lê o romance».

Tenho andado a adiar. Na verdade, já o iniciei, mas mal cheguei à página 28. Porquê? Para o não esgotar muito rapidamente? Porque o início ainda me não prendeu como esperava, e decidi caminhar com mais vagar, tentando encontrar o ponto, a frase, a chave a partir da qual tudo se ilumine e o seu sentido se me torne irresistível? Sei que me não decepcionará - porque, de todos os inúmeros livros que o primo me recomendou, não houve um único que se não tivesse vindo a tornar um caso absoluto e desenfreado de paixão. Seria estranho que um livro que o conquistou deste modo nada tivesse para me oferecer também. A viragem surgirá: ando a tacteá-la, sob a pele das frases, escondendo-se de mim, em secretos e subtis movimentos que não consegui ainda percepcionar. Mas é uma questão de tempo. Sei isso.

3 comentários:

Zé alberto disse...

Lembro-me de ter passado por isso, José, por isso tudo, por isso mesmo, essas sensações que você tão bem relata, da certeza de um livro que nos irá maravilhar mas cujo fascinio só aparecerá em páginas que não as iniciais.
Aconteceu-me com o "Jóia de Família" da Agustina, da qual me habituei a aguardar o que me surpreende, o que me maravilha pela sageza, e, que nessa obra, só a meio do livro começa a dar sinais evidentes.

abraço.

Mariana disse...

Quando inicio um livro e não gosto, a tendência é abandonar, para talvez retomar novamente, sem contar que leio várias coisas ao mesmo tempo, aos pedaços, às vezes sem concluir - uma leitura (e leitora) indisciplinada.

Isso tem uma explicação: o século XX trouxe o conto, a short story, a narrativa breve como um forte concorrente ao romance. Guimarães Rosa, considerado o maior nome da literatura brasielira do século XX, escreveu apenas um romance, "Grande sertão: veredas": todo o restante de sua obra são contos, de maior ou menor extensão. Clarice Lispector escreveu romances, mas também contos, crônicas, fragmentos.

Mas acho também que isso pode ser uma deficiência da minha formação, afetada demais pelo relato curto.

sonia disse...

Pergunta a teu primo a que altura do livro (apenas para teres uma idéia) a coisa deslancha...:) assim já vais mais relax leitura afora!