domingo, 27 de junho de 2010

O MISTÉRIO EM A. M. PIRES CABRAL


Aprecio o estilo e as histórias de A. M. Pires Cabral.
Descobri-o com um romance muito belo, na sua escrita elegante, discreta e fluente, O Cónego, que se vai armadilhando em torno de um mistério que as personagens pressentem na leitura de certos papéis sobre o passado de (é claro) um cónego.

Se todo e qualquer romance tem, no seu melhor, que ver com um "mistério" (a dialéctica, afinal, entre o que se conta e o que se oculta), é talvez nesse jogo de escondidas com o leitor que encontramos um dos mecanismos para a separação das águas: o demarcar, dos grandes romances, os romances menores.

Depois li São Cirilo, cronologicamente anterior, completamente diferente, ao jeito de uma alegoria: mas, o que é curioso, encontro nessa novela antiga de Pires Cabral a mesma forma interessantíssima de lidar com o mistério. Não vale a pena desvendá-la, seria uma perda para o leitor que o queira ler e descobrir por si. Digamos, de uma forma também misteriosa q.b., que, nos textos do autor, o que o leitor ignora e o espicaça é sempre tratado ao contrário de como o deveria ser num romance policial.

Que dizer? Deixei-me seduzir completamente pela escrita de A. M. Pires Cabral. Tendo iniciado ontem um seu livro de contos, editado pela Cotovia, e que é, com outro título (O Porco de Erimanto), a recuperação de uma obra de juventude, agora rescrita e com alguns contos mais, reencontro, num estilo menos discreto, extremamente irónico, assumidamente queirosiano, a limpidez da narrativa, a obscuridade de um mistério.

É encantador.

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