terça-feira, 17 de abril de 2012

DOIS CONTOS QUE LI NÃO SEI JÁ QUANDO

Lembro-me de ser miúdo e ter lido, em dois números diferentes de alguma revista, dois contos que me impressionaram.
Posto isto, não sei que revista era; e precisemos: não sei se li um conto em um número e outro em outro, nem sequer se se tratava, de facto, da "mesma" revista; e, já agora, também não garanto que fosse miúdo, ou quão miúdo seria. Na memória, vejo-me bem pequeno. Mas a memória é uma fonte de enganos e, no meio do nevoeiro, não ressaltam senão estas histórias, com toda a nitidez.

Conto-os telegraficamente:

Em um deles, narrava-se como um homem cometera um assalto grandioso. Levou muito dinheiro e escondeu-o. Tinha um sonho e infinda paciência. Suspeitaram dele, prenderam-no. Fizeram perguntas, torturaram-no. Mantinha-se, porém, em silêncio, sempre em nome do seu sonho, o qual teria de esperar. Fizeram-no passar fome, impediram-no de dormir. Perdeu a mulher, raptaram-lhe os filhos. Ameaçavam-no constantemente. A sua resposta era o silêncio: esperaria que se esquecessem e o deixassem. Esperaria o tempo que fosse preciso, sofreria o que tivesse de sofrer. Envelheceu. Vivia só, com fome, com frio - e ao fim de todo esse tempo, num raro momento de felicidade no todo da sua vida de adulto, foi desenterrar o dinheiro. E descobriu que aquelas notas estavam fora de circulação.

No outro conto, tratava-se de um [jovem] casal enamorado. Sem dinheiro, a jovem possuía algo de que se orgulhava: o seu longo e invejado cabelo; o jovem, por sua vez, era proprietário de um relógio em prata, que gostava de mirar [apesar de lhe faltar uma corrente a condizer]. No Natal, a mulher sacrificou o objecto da sua vaidade - cortou e vendeu o cabelo, com o fito de comprar a corrente em prata, lindíssima, devida ao relógio do esposo.
Acontece que a prenda deste, era um caríssimo enfeite para o cabelo dela. «Deixa lá», respondia-lhe a mulher, «há-de voltar a crescer!»
E esperava ansiosamente que ele desembrulhasse a sua preciosa corrente:- o que ele fez, para confessar que, para comprar o enfeite, tivera de vender o relógio.

E estes dois contos nunca me largaram na vida...

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