«Sabe-se, por experiência, que a primeira condição para que uma ideia vá longe e depressa é ser enunciada singelamente e ao alcance dos simples, que a sua fórmula, aguda e rápida, entre na cabeça de cada pessoa, só com uma pancada.»
Stefan Zweig
Fala-se agora muito de Pedro Chagas Freitas. Não é difícil, ele está por todo o lado. PCF é um escritor imparável. Tem livros de variadas dimensões, alguns de uma invejável grossura, outros de nem tanta. Tropeçamos no homem nos escaparates, nas montras, nas estantes, nas prateleiras dos mais vendidos. Será esse seu talento para se multiplicar, o que enerva tanto? Reparo que alguns dos autores - como o José Rodrigues dos Santos ou a Margarida Rebelo Pinto [olha, todos com 3 nomes?] - que mais comichão provocam nos intelectuais, são escritores que vendem aos milhares, e vários nexos causais poderiam tentar-se para explicar essa recusa da sua omnipresença: inveja por parte dos snobes? Ressentimento dos autores candidatos a Nobel, que, entretanto, têm vendas residuais? Ou um povo abruti, inculto, que incensa a mediocridade - um certo tipo de mediocridade?
Para além de prolixo, Pedro Chagas Freitas tem títulos que me parecem interessantes. Casa Comigo Todos os Dias, que diabo!, é bom. Prometo Falhar é excelente. Já o novel Prometo Perder cheira a mais do mesmo, à fixação numa fórmula, à incapacidade de se renovar.
Tenho de ser sincero. Nunca li um Pedro Chagas Freitas na íntegra. Mas uma espécie de crónicas suas que circulam pelo facebook não são horrorosas. Com boa vontade, reconhecemos, aí, ecos das crónicas de Lobo Antunes para a Visão, porventura o melhor de Lobo Antunes - mas tanta gente diz isto acerca das crónicas deste na Visão, que a frase se tornou um cliché. Claro: apesar de tudo, não é Lobo Antunes quem quer. E onde, neste, captamos uma inesperada vulnerabilidade, uma delicadeza de sentimentos, uma tristeza e uma saudade trémulas, um medo de criança, sob a capa do machão, um lirismo discreto e um domínio das palavras, em PCF encontramos sempre uma respiração de lugar-comum, déjà-vu, um sentimentalismo fácil, que não é exactamente o mesmo que sensibilidade. A espaços, é bonito. Do que tenho lido, nunca é péssimo. Apenas pouco original, delicodoce, preparado para acertar na bolha das lágrimas, como certos filmes românticos norte-americanos. Há uma receita: pega-se [por exemplo] numa criança de 6 anos perante o divórcio dos pais; a mãe que chora; o menino que testemunha as lágrimas da mãe, e compara essa experiência com a de comer um prato de sopa fria, e tal. Lê-se. Esquece-se. Ou não se perde tempo a ler. Na escala do medíocre, é melhor do que José Rodrigues dos Santos e do que Margarida Rebelo Pinto.
6 comentários:
Concordo inteiramente com a apreciação. E não é preconceito. É certo que conheço pouco de PCF, mas fiquei esclarecida quando o ouvi dizer que escreve 5000 palavras por dia e não faz revisão de texto. Os textos que tenho visto na internet são variações pouco criativas de lugares-comuns. Não me surpreende o sucesso porque tenho ideia que boa parte das pessoas lê para confirmar o que pensa e não para descobrir novas ideias ou mundos diferentes.
Obrigado pelo comentário, Carla C. Uma amiga minha escandalizou-se com a comparação entre PCF e Lobo Antunes. Ela tem razão, trata-se de uma comparação que tem de se manusear com mil cuidados. Mas julgo mesmo que PCF leu Lobo Antunes, tenta apanhar o espírito e consegue um LA de pechisbeque. Outro amigo indigna-se com a frase, de PCF, sobre a «pornografia de estar vivo». Uma última (e perigosa) entrada: o mérito que terá um homem em escrever para atingir um público feminino que o adora. (Não, não falo senão de um certo número e um certo tipo de mulheres...)
Boas.
Preconceitos é algo que não faço de nada nem de ninguém. Quando critico ou elogio é meramente uma opinião pessoal e jamais pretendo atingir o autor ou o leitor.
Dito isto, já li duas obras de Pedro Chagas porque quis perceber se de facto o homem tinha qualidade literária que muitos diziam ter (li algures alguém que defendia que um dia ele sera nobel da literatura) e os dois livros que li deparei-me sempre com frases feitas, clichés e "lugares comuns", frases pensadas para serem retiradas de forma isolada e coladas em publicações (não sei se me faço entender), de pouca ou nenhuma profundidade literária e com conteúdo muito fraco.
Mas é a minha opinião e obviamente que respeito quem vê neste autor um supra sumo literário.
Percebo perfeitamente, Miguel. Uma amiga minha - que não gosta dele - diz que, sendo homem, PCF tem no entanto o mérito de intuir como escrever para um certo público feminino - «um certo»; não obviamente para todas as mulheres, seria insultar o género. E conseguir que esse «certo público feminino» lhe venha sempre comer à mão, de lágrimas nos olhos...
Boa tarde,
Eu acho é que os livros do Pedro Chagas Freitas não lhe fazem justiça. É um escritor compulsivo, que raramente falha, e é de uma inteligência e de uma perspicácia mental assombrosa. Impressiona, mesmo.
Eu já me inscrevi num dos seus cursos e, sim, ele ensina. Ficamos surpreendidos com a visão que ele nos coloca à frente. Aprende-se muito. Gostei imenso do "curso" e como pessoa admiro-o: é aplicado, persistente, quase obcecado pela escrita, terra a terra, humilde (acredito) e escreve bem. Melhor que muitos e, naturalmente, pior que muitos.
Mas não posso deixar de achar, também, que o PCF tem uma veia de marketeer (genial, não obstante) que prejudica a sua escrita; deixa-se levar muito pela ambição de chegar ao fim de «mais uma obra». Para o divulgar, para o cortar em pedaços, para o lançar ao mundo. A densidade do conteúdo e a própria criatividade, que tanto defende, saem empobrecidas. Confesso que muitas vezes também me irritam os clichés (as palavras mudam mas as ideias são universais) de algumas frases, assim como os trocadilhos constantes.
Gostava mesmo de o ler noutro registo, numa narrativa mais fluída, mais densa, porque paixão pela escrita, inteligência e mérito o PCF tem de sobra.
Merece acima de tudo: respeito pelo seu trabalho.
Cumprimentos e
Boas leituras!
Boa tarde,
não me custa nada acreditar no que me diz. Mas entenda que, quando o não conhecemos pessoalmente - e nunca convivemos com ele, nem participámos em nenhum curso -, aquilo que nos resta para o analisar é a obra e o enquadramento desta. Os clichés, por um lado, o «escrever para o público» (que é uma coisa que cheira à légua) e a multiplicação até ao infinito, por outro lado. Todos os que trabalham merecem respeito pelo seu trabalho, pela persistência. Mas as suas opções não podem estar acima de críticas. Muito obrigado pela sua leitura e pelo seu comentário.
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