O que primeiramente nos toca ao lermos um romance de Svevo é a limpidez criativa da sua escrita: as frases, longas e muito bonitas, compõem-se de um modo sempre extremamente original, mas nem por isso fatigante, nem por isso provocando qualquer sensação de indigesta estranheza. É, pois, uma originalidade que nos soa imediatamente como um fluxo límpido, e que só nos apetece reler por causa da sua musicalidade característica, uma beleza que convida ao recomeço.
Depois, claro, toca-nos o seu humor. Os protagonistas masculinos de Svevo são homens mesquinhos, que tomam o seu interesse por princípio de acção, justificando os seus comportamentos, porém, com argumentos que raiam o desaforo. Como se fosse normal a "universalização" sistemática do interesse próprio; como se pudéssemos realmente assumir por lei moral a ideia de que «um acto é bom sempre que me traz algum benefício pessoal».
O centro de gravidade dos romances de Svevo [dos que eu li, pelo menos] é a tensão entre este egoísmo do homem e o seu interesse ou encantamento por determinada mulher, encantamento que se desdobra numa multiplicidade de sentimentos - atracção, desejo, medo, ciúme - mas nunca se identifica com amor ou paixão: o verdadeiro egoísta é demasiado centrado em si para se apaixonar por outrem. Ou para amar sem que se trate de amar-se.
Em "Senilidade", de tudo isto se trata; e também, já agora, de uma espécie de egoísmo feminino, embora na mulher permaneça sempre um enigma, um mistério que não conseguimos inteiramente reduzir a qualquer explicação. O que move as mulheres de Svevo é sempre mais ambíguo e inclassificável do que o que move os homens.
Como, porventura, na vida real.
Conheci um homem com esse egoismo de que fala Svevo. Eu até chamaria de avareza, no caso. Meu primeiro impulso foi mandar o livro a ele, anônimamente, claro. Mas depois refleti que seria gastar "boa vela com mau defunto".
ResponderEliminarO egoismo feminino é algo perverso. No homem o egoismo beira a uma ideologia.
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