sábado, 3 de agosto de 2013

HÁ SEMPRE UM DÂMASO CÂNDIDO SALCEDE NUMA ESQUINA PERTO DE SI



Camões, Pessoa e todo o seu drama em gente. Eça, Camilo. Alguma coisa de Saramago. E Gonçalo M. Tavares. [Embora o último seja muito novo, muito recente, e possa parecer precipitação minha incluí-lo; mas, enfim, a considerar que, dos novíssimos escritores, já poderia propor algum, não tenho dúvidas de que seria GMT.] Se não os vejo como deuses, encaro-os como o estofo da poesia e da literatura em língua portuguesa.

Neste  estatuto, há lugar para outros tantos, entre os quais muitos escritores brasileiros que não me dei ao trabalho de mencionar. A minha paixão não se concentra nos referidos, numa relação de exclusividade. Falo destes, porque são mais universal e inequivocamente aqueles sem os quais o português literário seria, de certeza, outra coisa qualquer.

Com a minha longa introdução, procuro que se não enganem acerca das intenções dos argumentos que usarei. Não há deuses. Querer continuar-se Os Maias não me parece, portanto, um acto de profanação. Só mesmo um gesto disparatado e ridículo.

O Expresso (jornal, aliás, cuja revista-cartaz, dirigida por Pedro Mexia, degusto, regularmente, com prazer e proveito) convidou José Luís Peixoto e José Eduardo Agualusa, Mário Zambujal (e a que título Mário Zambujal?) e José Rentes de Carvalho, Gonçalo M. Tavares e Clara Ferreira Alves (e porquê Clara Ferreira Alves?) para prosseguirem Os Maias. Pode ter sido uma ideia de algum senhor do marketing. Muito baixinho e com demasiada energia, ao jeito destes últimos assessores do governo de P. P. Coelho, tão satisfeitos com o seu poderzinho, benza-os Deus! No fundo, um Dâmaso Salcede do Portugal do século XXI (que, naturalmente, pouco mudou em relação ao Portugal de Eça). Mas os escritores convidados prestaram-se a isso!? Não os fez estremecer, não, repito, o pavor do sacrilégio, mas o receio do ridículo?

Os Maias não precisa de prolongamento. Eis o ponto. Queiram seguir-me: basta ler-se o "início da continuação", pelo punho de José Luís Peixoto, para nos apercebermos da vertiginosa extensão da tonteria e do equívoco. Ora vejam: «Ainda o apanharam!» Ora abóboras! Com um só período, escangalha-se o fim, sabiamente aberto, que Eça de Queirós carregara de uma subtil ironia, de tristeza e cepticismo, de um conformismo nervoso e eufórico, de um quasi-optimismo melancólico, num paradoxo em que o cómico alivia, mas não apaga o trágico. Faz-se dele um princípio obtuso: «Ainda o apanharam» - e seguem por aí fora.

Julgava-se homenagear a sua referência maior? Isso é que é trágico, menino, isto é que é trágico.

1 comentário:

Teresa disse...

Soube do excremento (para referir Alencar, claro) pelo Delito de Opinião, logo que a notícia veio a público. Incomodou-me tanto, mas tanto, que nunca escrevi sobre o assunto, mas acabei a debatê-lo no Facebook com duas amigas e um descendente de Eça.

Aquilo que mais me surpreende é que os nomes convidados tenham pactuado com ideia tão imbecil. Suponho que o dinheiro tenha falado mais alto, e tenho mesmo muita pena.

Aproveito para lhe dar a conhecer o extinto (com grande mágoa minha) o blogue de uma dessas amigas, a Ana Vidal, que hoje só escreve no Delito de Opinião.

Tenho a certeza de que vai ficar rendido.

http://portadovento.blogs.sapo.pt/