segunda-feira, 1 de agosto de 2011

MANN, ROTH, SANTOS


Estou muito longe [é um eufemismo] de admirar José Rodrigues dos Santos. E se alguma vez tentei ler um dos seus livros, e confesso que sim, rapidamente o benfazejo manto do esquecimento se encarregou de o lavar e levar da minha memória.
Curiosamente, no seu programa de entrevistas, a que chama pomposamente Conversas de Escritores (não fossemos nós, por acaso, esquecer-nos de que ele é «um escritor», coisa que, de facto, não é), entrevistava, há dias, Philip Roth.

Fiquei deveras surpreendido, porque Roth goza da fama de detestar pessoas em geral, e entrevistadores em particular - ter-se-á enganado a ponto de acreditar que Santos era digno daquela conversa? Duvido.
Em todo o caso, lembro-me de que, entre outras coisas, Philip Roth disse que a leitura, tal como nós a conhecemos actualmente (ou a conhecíamos, até há uns anos) ia mudar completamente. Dentro de algumas décadas, não haverá senão leitores de uma nova literatura, sem papel, sem ironia, sem descrição, sem exigência de tempo.

Eu conheço a conversa: os reaccionários (os «velhos do Restelo») foram apregoando sucessivamente o fim da rádio, substituída pela televisão, e o fim do cinema, substituído pelos vídeos, e o fim do livro, transformado em e-book.
Eu não sou reaccionário. Ou sou. [Alguém me chamou, há tempos, «Velho do Restelo», a propósito da minha persistente recusa do Acordo Ortográfico]. Mas entendo Roth. Que, aliás, não se queixava. Entendo-o na medida em que o que ele afirma é mais subtil do que a mera questão do suporte do livro.

E aqui surge Mann, Thomas, Mann, um escritor a sério, extraordinariamente superior a Roth (e nem vale a pena a comparação com Santos).
Escrevia, num post anterior, que já ninguém lê um livro como Os Buddenbrook. É, pois, disso que se trata: já ninguém consegue ler um certo tipo de descrição, já ninguém («ninguém» é exagero, claro: ainda restamos três; quatro, com boa vontade) tem paciência para usufruir a linguagem, a «petite musique» das palavras, o prazer poético do significante, por si mesmo.

É uma mudança. It's quite a change, really! [Santos terá compreendido a ideia?]

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