sexta-feira, 6 de agosto de 2010

CHRISTOPHER POTTER: VOCÊ ESTÁ AQUI: UMA HISTÓRIA PORTÁTIL DO UNIVERSO



Sou um moderado compulsivo, se é que a expressão faz o menor sentido, de livros de divulgação científica. Como a área de ciências constituiu sempre, para mim, um bico-de-obra e, enquanto aluno, tudo fiz para escapulir à perseguição das químicas e das matemáticas, mais tarde senti a nostalgia dessas disciplinas que não aproveitara, desses temas de que não usufruíra. E os livros de Carl Sagan ou de Hubert Reeves, através das suas explicações simples [que eu acreditava não serem porém simplistas] faziam-me transpor, com um evidente prazer, e algum orgulho, o limiar de um mundo de teorias que procuravam abarcar o universo inteiro.

Um problema dos divulgadores científicos, todavia, é que, em geral, mesmo sendo homens de uma cultura abrangente, mostram certa dificuldade em não apresentar a sua ciência como uma visão à parte, se não de costas voltadas, para outras formas de sentido. Está subjacente a antiga separação entre o científico e o literário, entre as duas aparentemente irreconciliáveis "culturas", que traduzem, de algum modo, operações distintas de hemisférios distintos.

E é nisso que Você Está Aqui, de Christopher Potter, se revela um livro de divulgação científica incomum. Afinal, o que entusiasma o autor é a possibilidade da ligação entre as duas fontes - esforço esse que, aliás, ao longo dos seus estudos, sempre foi incompreendido e desprezado. A lembrança, em particular, de uma curta divagação de um professor, na altura em que voltara à universidade para realizar um curso de história e filosofia da ciência, fornece-nos a chave secreta deste livro:

«A minha mais forte recordação desse ano foi a de uma observação feita pelo chefe de departamento, de que me lembro em parte por ele a ter desmentido de imediato e, em parte, por a ter associado à minha contínua sensação de me encontrar no exterior do mundo que pretendia habitar. Ele interrogou-se sobre o que seria ensinar piano sabendo que as duas únicas variáveis físicas são a velocidade e a força com que as teclas são percutidas. Fazendo uma breve pausa, interrogou-se sobre se, na realidade, não haveria apenas uma variável - apenas a força - dado que a acção do piano é fixa. O meu coração saltou com interesse. Aqui estava uma possível ponte sobre o rio. "Mas estamos a desviar-nos para a estética", concluiu o professor, e mudou de assunto».

Pois bem: Você Está Aqui, subintitulado Uma História Portátil do Universo, procura e consegue ser essa «ponte sobre o rio».

Christopher Potter escolhe, como início, a perspectiva egocentrista de cada um de nós. Parece-me um achado: a partir daí, alarga, salta, rasga, ao mesmo tempo que, paradoxalmente, reduz - ou seja, "reduz" cada indivíduo humano, cada eu, a um ponto no incomensurável, em busca daquilo que os cientistas fundamentalmente buscam: uma perspectiva extra-terrestre, no sentido em que se concebe uma explicação que não seja auto-centrada, mas possa valer tanto na terra como de qualquer outro ponto de vista no universo. Fá-lo convocando os antigos e os modernos filósofos, poetas e cientistas, numa abundância de informação que, se é sempre clara, parece muitas vezes pecar por excessiva. Não o é, contudo: de que outra maneira se poderia escrever uma história "portátil" do universo?

Necessário é, pois, que este livro, que se lê muito rapidamente, se releia e vá relendo, depois, lentamente. Necessário é que a ele voltemos muitas vezes, ou tão-só na medida do nosso interesse, ou do que fomos percebendo numa leitura fácil, mas sem o haver compreendido em todas as suas implicações.

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